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Pois como estava sendo dito, ou melhor, reportado, já que é tudo verdade e
de fato aconteceu, a atriz Maitê Proença, um dos mais suaves exemplos da beleza
clássica brasileira, acabou de deixar a cabine de onde viu um strip-tease no
peep show de
Copacabana. Ela agora adentra, gloriosa, num duas peças bege casual, o camarim
onde as artistas do espetáculo aquecem as turbinas para, em seguida, decolar seus
aviões diante da plateia.
O espaço é pequeno, uma sala quatro por quatro cercada de espelhos e
duas câmeras que varrem tudo. As moças ficam nuas, mas as câmeras não procuram
cenas de lascívia. Estão ali para fiscalizar se aquelas funcionárias comem em
serviço, vasculham os pertences da colega, recebem um espectador ou praticam
qualquer outro expediente proibido pelo proprietário do peep show. Não é
gafieira, outra assombração carioca em desuso, mas o ambiente exige respeito e
cumprimento das leis trabalhistas.
O clima é de sala de fundos de repartição pública. Excepcionalmente hoje
as servidoras recebem a visita da grande senhora que veem nas novelas da
televisão — e estão, no sentido social do termo, excitadas. Quando Maitê
pergunta se elas conseguem alguma vibração sexual com o métier, caem na
gargalhada, e uma delas provoca, suspirosa: “Um beijo técnico no Malvino
Salvador deve ser bem mais estimulante”.
São dez moças, quase todas negras, e trabalham as mesmas oito horas
tradicionais que regem os serviços convencionais da sociedade. No verão, cada
uma delas levou em média uns R$ 2.500 para casa. Agora, com a temperatura caindo,
a libido masculina vai sendo de alguma maneira atingida e elas sentem que as
fichinhas que pagam seus shows começam a oscilar em movimento de queda tão
acentuada — será que a Miriam Leitão explicaria? — quanto a das ações da
Petrobras na Bolsa.
As famílias delas sabem de tudo. As que têm companheiros sofrem um pouco
com o ciúme deles, mas é preciso tocar o grande barco negro da vida. Ao mesmo
tempo em que conversam com Maitê, as funcionárias estão de olho na sinalização das
luzes que fazem a onvocação para entrar
em cena.
Uma luz especial avisa quando a moça deve ir para a sala privê, onde,
sempre separada por um vidro, fará um show de caras, bocas, rebolados e sugestões
para um único homem. Recebem o dobro de fichas por isso. Em troca, rendem mais
na picardia, acatam sugestões do homem atrás do vidro.
“Mostra a sola dos pés”, pede um. Outros pedem que a stripper se
aproxime mais do vidro, onde há alguns buracos mínimos nele, para lhes sentir o
cheiro.
“Tesão”, devolve a moça, tentando fazer uma expressão de pantera, como
se agradecesse na língua local o depósito acalorado das fichinhas extras — e,
assim que elas param de pingar, corre para curtir um pouco mais da presença de Maitê
Proença no camarim.
“Você acha que eu devo colocar silicone no peito?”, pergunta uma das moças,
que acabou de amamentar uma filha.
“Deixa eu ver de perto esse piercing”, pede Maitê para outra que o tem
logo acima da vagina.
“Você está fazendo laboratório?”, quer saber outra sobre as reais intenções
de a atriz estar visitando a casa.
Seguiu-se uma informativa conversa sobre técnicas de autossatisfação
feminina, quando foi unânime a aprovação do diminuto Bullit, na contramão do
modismo internacional que aplaude o gigantesco Rabbit das garotas do “Sex and
the city”.
Ao final, Maitê e as strippers sacaram de seus celulares e começaram uma
intensa troca de cliques para seus álbuns particulares, despedindo-se com
beijinhos e aplausos mútuos.De volta ao corredor, lá estavam, sérios, desconfiados,
os homens que sustentam, com a eterna curiosidade visual masculina, aquele
curioso palácio de sexo retrô. Em seu diário, Maitê anotaria: “É triste ver
aqueles homens com ar de quem faz algo errado, cabeça para baixo,
envergonhados. Que culpa desgraçada faz esses homens virarem moleques pecadores?!
Ninguém está fazendo nada de errado e abusivo ali, há um acordo de adultos,
tudo certo”.
Mas, definitivamente, ela gostou da experiência e seguiu em seu texto: “As
moças não fazem nada mais abusado que numa quadra de funk, o que muda é saber
que é escondido, ter a sensação da privacidade para fazer o proibido no meio da
tarde, na hora do trabalho. Eles sabem que elas sabem. Gosto desse acordo entre
stripper e voyeur. Como se dissessem ‘estamos aqui, sozinhos e escondidos para isso.
Dane-se o mundo’”.
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