Luana Piovani não gostou


Olhamos as linhas do corpo, mas somos capazes também de ler nas entrelinhas
Luana Piovani leu a crônica da semana passada, um carinho sobre as mulheres que estão fora do padrão da beleza em cartaz. Não gostou. Criticou a sugestão do colunista para que o programa “Superbonita”, do qual é apresentadora, fizesse, na contramão do poema “Receita de Mulher”, de Vinicius de Moraes — aquele da beleza é fundamental —, um especial pacificador sobre a bobagem de se reprimir uns centímetros a mais nos culotes e outras aflições daquelas que o mundo tacha como feias. Luana Piovani respondeu pelo seu tambor preferido, o twitter:

“Sugestão declinada. Teremos sim programa para como se livrar deles. Precisamos de audiência e ninguém vai assistir a um pgm que incentive a inércia no duvidoso. Incentivamos a sua melhor versão. Todos temos! Agora, você me diz onde estão esses homens que curtem bunda mole com furinhos, a testa giga, barriguinha e cabelos crespos polvorosos pq no planeta q moro, homem tá mais vaidoso q a gente.”

Daí que peço licença aos leitores para hoje escrever diretamente a Luana, uma das mais completas e perfeitas traduções em 2013 do poema de Vinicius.

Querida Luana,
A versão mais bonita de uma mulher é aquela que aprendemos a admirar e, se me permite a simplicidade de incorporar a linguagem twitter, ter tesão. Vamos colocar a língua para fora e deixar escapulir o Einstein que nos habita. Esse negócio de “bunda mole” é muito relativo. Eu conheci uma moça que poderia ser enquadrada nessa categoria e, no entanto, noves fora a suposta flacidez, era linda. Ela se movimentava como uma dessas garças que o Vinicius fazia pairar sobre as árvores de suas poesias, um pescoço de dois metros, e aquilo era um espetáculo de soberba tão deslumbrante que só agora, Luana, provocado por suas palavras, percebo que talvez ela pudesse estar nessa categoria calipígia que você desdenha como um downgrade. No entanto, tal moça tinha borogodó. A soma do quadrado dos seus catetos dava o quadrado de uma hipotenusa fantástica. Fomos felizes assim. Eu estive ali, pertinho, e longe de qualquer acidez crítica, era-lhe só reverência e vassalagem.

De homem eu entendo, Luana, e não sou bobo de desdenhar da carne dura, da pele macia, da bunda desenhada a compasso e outros clássicos da mulher bonita. Mas nem sempre é possível tamanha poesia numa hora dessas. Tenho certeza que havia dois Vinicius de Moraes. Um sentava à escrivaninha, no tempo da caneta tinteiro, e escrevia sobre a necessidade de que os seios tivessem “uma expressão greco-romana, mas que gótica ou barroca” e pudessem “iluminar o escuro com uma capacidade mínima de cinco velas”. Outro Vinicius andava pelas ruas. Seguia as mulheres com os olhos, súdito servil em lhes encontrar outros tipos de graça. Era capaz de, diante de alguma de seios de expressão divertidamente cubista, pedir o favor de que lhe caíssem nas mãos, róseos, plúmbeos, da cor do azeviche ou do maracujá, e fizessem o favor apenas de apagar a dor, aquietar o espírito e pôr ordem na correria insana de uma vida de resto sem sentido.

Definitivamente, Luana, vida real é outra coisa. Não cabe na pauta do ótimo “Superbonita”. Ninguém precisa ser super em nada. Assim como você, também acredito que todos temos a nossa melhor versão e precisamos incentivá-la, mas o que se vê em geral é a tentativa de obrigar todas as mulheres ao mesmo padrão. Fazê-las correr obrigatoriamente atrás do cabelo chapinhado, das pernas musculosas e dos peitos com a centimetragem de uma bomba que vai daqui até o pé da página, mas apontando para o alto, claro, prestes a estourar nos olhos do freguês. Há quem dê preferência, mas existem homens com desejos mais sutis. Eu, a propósito, sou das antigas, e aproveito o ensejo para cantar Noel, aquele do “há tantas santas no mundo, que vivem fora do templo, santas de olhar tão profundo, você, por exemplo, você, por exemplo”.

Nada contra a mulher bonita. Desde a primeira que eu vi, aquela com dois baldinhos na lata do Leite Moça, eu dedico boa parte do meu tempo a trazê-las para dentro das minhas retinas, jamais fatigadas com tamanho espetáculo. Eu só queria dizer, Luana, que homens têm um padrão mais elástico do que o recomendado na pauta do programa. Podemos, sim, curtir uma “barriguinha, a testa giga” e outras delícias a serem declaradas no próximo programa como esteticamente incorretas. Mulheres são desdobráveis, dizia a linda poeta Adélia Prado, e eu, mundano, já que a nossa pauta é outra, completo — elas são capazes de se redesenharem com um jeito de falar, uma maneira de silenciar ou uma promessa de queima de fogos ao se oferecer. Olhamos as linhas do corpo, mas somos capazes também de ler nas entrelinhas. Temos a força, como quer o desenho animado, mas ainda a espada da fantasia, a poesia da imaginação.

Qual de nós, diante daquele sorriso maliciosamente desengonçado, pediria, antes de se apaixonar, para avaliar, se duro ou com estrias, o bumbum da Diane Keaton?

Comentários

  1. Quando recebi mais feliz de todas as noticias da minha vida logo veio o desespero, serei mãe, terei estrias, celulites e principalmente falta de tempo para brigar contra tudo isso, pq alias sou uma trabalhadora brasileira assalariada que enfrente uma jornada de trabalho de 8h00 diárias, Paulista, levando mais umas 2 horas para me locomover nesta louca capital, resumindo o que valeria mais perder 2 horas na academia ou, 2 horas a mais paparicando minha cria? Escolhi a 2º opção, desculpe-me os homens, mais devido a minha escolha me tornei mais mulher que muita “super-gostasa” por ai... me considero hoje mais super que muita super “bonita”, sou “super-mãe”, super-esposa, super-trabalhadora, super-amiga, super-FELIZ!
    PARABÉNS PELO POST! Obrigada por nós fazer sentirmos um pouco mais SUPER! Super-Satisfeitas!

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  2. A sujeita não gostar de alguma coisa não é novidade, ficaria surpreso se fosse o contrário. Mas, e é um peculiar mas, tenho quase a certeira certeza que ela não entenderá xongas de sua réplica, ou tréplica. Em todo caso, se não chutou as canelas dela, o fez por uma boa razão.

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  3. Meu Deus.... este homem foi escolhido por Deus para colocar ela no seu devido lugar... não sou uma super-gostosa, mas sou uma mãe dedicada, uma dona de casa espetacular, sou batalhadora, lavo, passo, cozinho, limpo meu apto, cuido da minha filha, trabalho como compradora de uma empresa, tenho barriga, tenho meus furinhos, e sou desejada demais, e posso dizer com todas as palavras mais do que possa imaginar, porque tenho qualidades, muito mais que defeitos, no seu mundo querida, os homens querem isso, agora na realidade duvido que isso importa tanto quanto você fala... são milhares de mulheres que você ofende... milhares de mulheres que as vezes estão assim não pelo fato de querer mas porque algo além do que você possa imaginar aconteceu... eu quando leio o que você escreve... tenho nojo... tenho dó de você... é muito pequena mediante as mulheres que conheço que não precisa menosprezar as outras por um mero corpinho que vai com o tempo acabar como qualquer outro, temos valores que você desconhece, valores que hoje são para pessoas que você não se encaixa... e na boa fala tanto assim das mulheres e você acha então que está linda? Menos querida....
    Queria muito conhecer este homem colunista... digno de elogios e aplaudir de pé...

    Obrigada por falar por nós ....

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  4. Muito bom... as mulheres que se dizem lindas e se acham melhores por isso, merecem ler com atenção este texto e tentarem tirar alguma lição. A primeira é, não subestime o gosto masculino, homem que é homem, não dá mais importância pra bunda. De que adianta ter uma bunda e peitos lindos e ser vazia por dentro ?

    Luana, será que se vc fosse financeiramente menos abastada estaria bonita ??

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  5. Parabéns! Me sinto de alma lavada e poeticamente faxinada. Dane-se a Piovani! Sou pelo "borogodó! Um bom dia pra vc. Ana

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  6. Reverências a tão bela poesia em prosa.

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  7. Gente, a Luana Piovani é café com leite. Fala tanta merda, tanta asneira, que não se deve dar ouvidos. Ela ainda brinca porque é dona da bola. Só por isso.

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